Cidades
Edição de terça-feira, 22 de fevereiro de 2011
Sonho interrompido Uma cerca elétrica irregular vitimou o estudante André Batista da Silva, 11, durante jogo de futebol em Tangará
Paulo de Sousa
Mesmo morando no pequeno povoado de Lagoa do Feijão, em Tangará, a 88 quilômetros de Natal, o estudante André Batista da Silva, 11, tinha o sonho de ser jogador profissional de futebol. Para isso, ele treinava em um clube local e jogava bola todas as noites, em um campinho improvisado num terreno baldio da comunidade. Na noite do último domingo, esse sonho foi fatalmente interrompido. O garoto morreu eletrocutado ao encostar em uma cerca de arame farpado próxima ao campo, quando foi buscar a bola que foi chutada na direção do cercado. Segundo a polícia, José Lúcio da Silva, 40, que sofre de transtorno mental, teria eletrificado a cerca que circunda sua casa, ligada à do campo, de forma irregular. No entanto, ele não foi detido, segundo os policiais, por causa da sua condição. Familiares e amigos estão revoltados e exigem justiça.
Deficiente mental teria eletrificado cerca contínua a do campo Foto: Carlos Santos/DN/D.A Press
André Batista começou a jogar futebol por volta das 18h do domingo, juntamente com outros 20 garotos da comunidade. A chuva que caía naquela noite não impedia nem a ele ou aos demais de se divertirem. Já por volta das 20h30, enquanto ainda jogava, ele foi atrás da bola, que rolou para perto da cerca junta ao campo. O estudante Leonardo da Silva, 17, que participava da brincadeira, conta que o menino encostou a testa em um dos arames e as mãos em outro. Foi então que começou o desespero.
"Ele gritou, dizendo que estava levando um choque. Pensei que era brincadeira. Até o empurrei com o pé, para ver se ele parava. Mas aí senti o choque também". Outro colega da vítima, Rogério de Oliveira, 15, tentou ajudar o garoto, mas também sofreu uma descarga. "O chão estava molhado e só piorava. Foi muito assustador vê-lo gritando". Leonardo diz que só conseguiu soltá-lo ao amarrar uma camiseta à cintura do amigo e puxá-lo. Em seguida, populares que estavam em uma igreja evangélica próxima ao local socorreram o menino para o Hospital de Tangará, a cerca de dois quilômetros do povoado. No entanto, o garoto já chegou à unidade médica sem vida.
A polícia foi acionada para ir ao povoado. Osargento PM Carlos José de Lima, subcomandante do pelotão de Tangará, afirma que ao chegar constatou que a eletricidade da cerca na qual houve o acidente vinha de um fio da casa de José Lúcio. A fiação foi puxada de um poste e ligada à cerca que rodeia o terreno da sua do acusado. Essa estrutura é ligada aos arames do campo.
Os policiais então resolveram deter José Lúcio. Contudo, foram informados pela família que ele sofria de transtorno mental, além de ser surdo-mudo e sofrer de asma. "Quando entramos na casa, o acusado estava trancado em um quarto, todo encolhido e se mordendo", comenta Carlos Lima. O sargento diz que tentou entrar em contato com o delegado responsável pela cidade, Petrus Antonius, mas sem sucesso. "Precisava saber dele qual providência tomar, se podia prender ou deixar o acusado ali, já que era doente". Sem a resposta da autoridade policial, o subcomandante da PM local resolveu deixar o povoado e esperar a decisão do delegado.
O fato chocou familiares e moradores de Lagoa do Feijão. O paido garoto, o pedreiro Cícero Batista da Silva, 37, diz estar indignado e deseja que o acusado responda pela morte de seu filho. "Quero que ele seja punido de alguma forma. Sabemos que ele é mudo, mas louco não deve ser, já que mexeu com fiação elétrica. Nenhum doido faria isso. O que ele fez foi por maldade mesmo".
Sua família está muito abalada com tudo o que aconteceu. "É muito duro para nós perdê-lo dessa maneira". O corpo de André Batista foi velado em sua casa e recebeu a visita de muitos moradores de Lagoa do Feijão, todos comovidos. Ele foi sepultado na tarde de ontem, no cemitério da cidade.
O delegado Petrus Antonius explica que é preciso analisar se houve intenção em provocar a morte de alguém. Ele diz que a decisão do sargento PM Lima de não prender o portador de transtorno mental foi acertada. O delegado diz que, provavelmente, a punição para o acusado deverá ser a internação em um hospital psiquiátrico.
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