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Nota. Cid diz que contrato terá validade de quatro anos
Gustavo Miranda/26-2-2013
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BRASILIA - Em mais um discurso para cobrar providências dos órgãos de
fiscalização em relação ao que chama de escalada de denúncias de mau
uso de recursos públicos pelo governador do Ceará, Cid Gomes (PSB), o
deputado estadual Heitor Ferrer (PDT-CE) voltou à tribuna esta semana
para pedir explicações sobre o que batizou de “farra do caviar”: um
contrato publicado no Diário Oficial do estado detalhando a contratação
de um buffet, no valor de R$ 3,4 milhões, para abastecer a cozinha da
residência oficial e o gabinete do governador com iguarias que incluem
centenas de quilos do que há de mais fino na culinária internacional.
O
edital publicado dia 1º de agosto diz que o contrato — que prevê também
decoração e fornecimento de taças de cristal, arranjos com orquídeas,
700 garçons, 500 garçonetes e 15 chefs de cozinha — tem validade de um
ano. Mas o governador, em nota, disse que “a nova licitação com o buffet
Anira Serviços de Alimentação Ltda, com vigência iniciada no dia 1º de
agosto, não corresponde ao período de um ano. O prazo deve ser aditivado
— até o período de quatro anos —, da mesma maneira como aconteceu no
contrato anterior, de 2010 a julho de 2013”. A nota diz ainda que “os
valores são pagos conforme a demanda e não existe um valor fixo/mínimo
mensal a ser pago e o cardápio é feito de acordo com o evento ou
autoridade a ser recepcionada”.
De 2010 a julho de 2013, o mesmo
buffet recebeu do governo do Ceará R$ 3,5 milhões para garantir a boa
mesa a Cid Gomes, sua família e convidados.
Heitor Ferrer, único
deputado estadual que faz oposição a Cid Gomes, lista todas as suspeitas
que já rondaram o governador no uso do dinheiro público: de gastar R$
81 milhões com contratação de bandas e megashows de estrelas como
Plácido Domingos e Ivete Sangalo; de pagar R$ 67 milhões com frete de
aeronaves para levar a sogra e a família para passear em capitais da
Europa, do Caribe e dos Estados Unidos; e de pegar carona em jatinhos e
iates de empresários.
O cardápio previsto no edital para a
contratação dos serviços prevê até 495 pratos diferentes, e se apresenta
com uma variação de receitas preparadas com caviar, escargots,
bacalhau, salmão, presunto de Parma, funghi, vieiras, frutos do mar,
pães exóticos, croissants, toucinho do céu ou trufas. Ingredientes
indispensáveis nas cozinhas dos grandes chefs.
O deputado Heitor
Ferrer diz que a tabela de comidas tem nomes que o cearense sequer
imagina do que se trata, como arroz de champagne, risoto de ostras,
bolinhos de bacalhau com semente de papoula servidos com molho de vinho
tinto, bombinhas de escargot, bombinhas de salmão com caviar, escargot
na manteiga de alho para ser servido em pequenas tarteletes, camarões ao
sol nascente KG, canapés de caviar, canapés de presunto de Parma, chips
de banana com geleia de amoras, creme de escargot, crepe de lagosta,
sushi tropical, paellas variadas e frigideiras de arroz selvagem.
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Enquanto o sertão sofre com uma seca inclemente, o palácio do governo
se banqueteia. Serão gastos R$ 287 mil por mês e R$ 9.566 por dia, o que
daria para perfurar um poço profundo diariamente para os conterrâneos
que sofrem sede e fome no sertão. O povo está morrendo, e o governador
está servindo bombinhas de salmão com caviar, entre outras comidas que
nem sei pronunciar o nome — discursou Ferrer, na Assembleia do Ceará.
Em
Brasília, o deputado federal Eudes Xavier (PT-CE) também protestou
contra a “farra do caviar”. Na tribuna da Câmara, ele voltou a comparar a
comilança com a penúria da população carente no sertão cearense em
função da longa estiagem. O petista considerou desrespeitoso o governo
estadual gastar tanto dinheiro com a compra de lagosta e caviar,
enquanto os sertanejos passam fome e sede.
— Essas famílias só querem um poço para matar a sede — protestou Eudes Xavier.
Nesta
quinta, Heitor Ferrer voltou à tribuna para ler uma declaração do
governador Cid Gomes, em resposta à sua cobrança de explicações sobre os
gastos com o buffet: “Acho isso miúdo! É coisa de gente miúda, que vai
ser eternamente deputado”, disse Cid Gomes.
— Cid sempre responde
às minhas denúncias de forma jocosa, tripudiando. Eu posso ser miúdo no
tamanho, mas sempre vou brigar contra esses absurdos. O escândalo do
crédito consignado, que beneficiou parentes dele, este sim, o Ministério
Público está investigando, e ele vai ter que responder — disse Ferrer.
Além
da comida, os R$ 3,4 milhões do contrato preveem decoração,
fornecimento de talheres finos, taças de cristal, prataria, toalhas,
transporte, armazenagem da comida e músicos. Outro item do cardápio que
chama a atenção é o fornecimento de mil garrafas de 473 mililitros de
energético.