Demissão da ministra da Cultura mostra o PT fracionado
2015 será o pior ano do partido desde sua chegada ao poder
Petistas estão sem rumo para alinhar a sucessão de 2018
Por Fernando Rodrigues
Desde
a chegada de Luiz Inácio Lula da Silva ao Palácio do Planalto, em
1º.jan.2003, nunca um ministro do PT saiu da cadeira chutando tantas
portas como Marta Suplicy, que entregou sua carta de demissão nesta
terça-feira (11.nov.2014).
No
trecho mais explosivo de sua carta, Marta escreveu: “Todos nós,
brasileiros, desejamos, neste momento, que a senhora [Dilma Rousseff]
seja iluminada ao escolher sua nova equipe de trabalho, a começar por
uma equipe econômica independente, experiente e comprovada, que resgate a
confiança e credibilidade ao seu governo e que, acima de tudo, esteja
comprometida com uma nova agenda de estabilidade e crescimento para o
nosso país”.
Como
é senadora pelo PT de São Paulo, Marta terá pela frente mais 4 anos de
mandato para azucrinar a vida do Palácio do Planalto.
Quem
olha de fora e não acompanha política poderá dizer: “Qual é a
importância política da saída da ministra da Cultura? Nenhuma”. É um
erro pensar dessa forma e minimizar esse fato. Trata-se do sinal mais
relevante e eloquente desta fase pós-eleitoral. A saída de Marta
sintetiza a seguinte conjuntura:
1)
PT fracionado: o partido da presidente da República tem várias alas
insatisfeitas a respeito da forma como o governo vem sendo tocado. Marta
representa uma dessas facções, de tamanho não desprezível: ela foi
eleita senadora em 2010 com8.314.027 votos.
Marta
raramente esteve à vontade para conversar sobre política com Dilma. É
verdade que a agora ex-ministra da Cultura cometeu um erro tático ao
defender em público, no primeiro semestre deste ano, a volta de Luiz
Inácio Lula da Silva.
Só
que Dilma venceu a eleição. O que teria custado ter uma atitude
magnânima e chamar os petistas que viraram o nariz para ela durante a
campanha? Ocorre que a presidente reeleita preferiu se isolar ainda mais
após a vitória. Apesar do discurso protocolar de governar com e para
todos, sua atitude exalou um recado diferente: “Os incomodados que se
retirem”.
Quem
governa com o fígado acaba tornando os problemas maiores do que já são.
Dilma pode odiar Marta Suplicy. Faz parte. Mas a ministra demissionária
pertence ao PT e agora será por muito tempo uma voz discordante no
Senado –o Palácio do Planalto poderia ter evitado esse desfecho, mas
deixou tudo correr solto.
Como consequência, em 2015, o PT começará seu pior ano (em termos de coesão interna) desde a chegada ao poder, há 12 anos;
2)
2018 em aberto: tudo o que um presidente da República não precisa é
começar um novo mandato com a sua sucessão completamente em aberto.
Hoje, no PT, não há o menor consenso a respeito de quem poderia ser o
nome para disputar o Planalto em 2018. Pior do que isso. Começam a
aparecer teses como a do governador do Rio Grande do Sul, Tarso Genro
(PT), que sugere uma frente de esquerda escolhendo um candidato
presidencial não necessariamente petista.
Nesse ambiente, o partido gastará energia numa disputa interna fratricida em prejuízo do segundo mandato de Dilma Rousseff;
3)
Base aliada desarranjada: o PT é o maior partido da Câmara a partir de
2015, mas terá apenas 69 deputados –só 3 a mais do que os 66 do PMDB. Um
peemedebista, Eduardo Cunha (RJ), é hoje o candidato mais forte a
presidir a Câmara, mesmo sendo um desafeto de Dilma Rousseff.
Em
fevereiro de 2015, Dilma terá de enfrentar um cenário que combinará a)
uma economia ainda anêmica (ou em recessão) e b) a chegada oficial ao
Congresso de todas as acusações contra políticos aliados do governo no
escândalo da Petrobras.
Como
Dilma Rousseff poderia contornar todo esse cenário adverso? No curto
prazo, terá de “obedecer” Marta Suplicy e nomear “uma equipe econômica
independente, experiente e comprovada, que resgate a confiança e
credibilidade ao seu governo”. Só que o efeito psicológico inicial será
diluído ao longo do tempo. Não haverá consequência prática a ser sentida
pelos brasileiros, que continuarão a viver num clima de crescimento
medíocre da economia (ou até de recessão).
No
fundo, resta a Dilma Rousseff torcer para que o país retorne
rapidamente a uma rota de crescimento mais acelerado –pois aí terá sua
popularidade resgatada e o apoio político no Congresso então se
materializa por decantação.
Ocorre que esse cenário mais tranquilo para Dilma só existe nas análises edulcoradas de alguns governistas.
A verdade é a que Marta Suplicy deixou explícita em sua carta: mostrou que o governo de Dilma Rousseff está nu neste momento.
Fonte: Blog de Fernando Rodrigues – UOL
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